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Cel. Isaías Arruda - filho de Aurora ex-pref. de M. Velha |
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Estação de Aurora, aqui tombou Isaías Arruda em 1928 |
A tarde estava cinzenta naquela
Aurora pacata e provinciana de 1928. Uma enorme sensação de tranqüilidade
cobria os semblantes dos viajantes, assim como o coração e o pensamento da
multidão que se aglomerava na pedra da estação aguardando o trem. Uma cena
comum em todas as cidades interioranas atendidas pelo velho comboio da Rede
Ferroviária Cearense(RVC).
Nuvens cor de chumbo em formação
pareciam prenunciar no céu daquela Aurora antiga e calma, algo diferente
prestes a ocorrer: uma tragédia. Logo se constataria...
Naquela tardezinha quase insossa de
sábado, dia 4 de agosto de 28 quando muitos já se esqueciam dos episódios de um
ano antes, relacionados à presença do rei do cangaço na terrinha; o velho aparelho
do telégrafo da RVC de novo estava prestes a receber no código morse um
telegrama diferente. Um comunicado estranho; digamos que chave, para os
desdobramentos do acontecimento dramático que se seguira ao fato:
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Jagunços do cel. sob o comando de Zé Gonçalves. Foto de 26 Ingazeiras |
- “Antonio, algodão hoje sobe!”. Eis a mensagens...
Uma missiva
quase enigmática considerando que o algodão – o ouro branco d’Aurora daquele
tempo, faria sempre o sentido contrário, ou seja, descia pras bandas do litoral.
E o seu preço no mercado há muito era de todos conhecido.
Porém, aquela mensagem sertanejamente
codificada não seria de todos estranha. Havia um destino e um desiderato certo:
os paulinos com o fito de surpreender o coronel.
Dizia muito mais do que ali
estava escrito de modo lacônico... A estação de Aurora estava repleta de
gente. Um acontecimento que se tornara comum deste a sua inauguração festiva,
oito anos antes, isto é, em 7 de setembro de 1920.
E a cronologia do momento seguinte, logo
provaria para todos que o pano de fundo era um crime. Um atentado violento à
ordem e a vida em nome da vingança e da intolerância de uma região marcada pela
lei do bagamarte. Uma intriga passada à limpo. E como se viu, expressa na força da violência e
da ignorância em detrimento da razão e da justiça. Sinais de uma época
densamente marcada pelo poder de fogo do coronelismo oligárquico, engendrado
pelos mais temíveis e truculentos líderes políticos que o Cariri cearense já
experimentou um dia. Um período onde a lei no mais das vezes, quando prevalecia, era a do mais forte. Enquanto a
justiça quase sempre, era feita, via de regra pelas próprias mãos, em geral, dos poderosos.
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Estação de Aurora em dia dia exposição de fotos antigas |
Naquele sábado, de uma tarde escura de
agosto, a estação de Aurora não demoraria a ser palco de um episódio que marcaria à história do Cariri e do Ceará para
sempre como um nódoa incômoda. Vez que envolveria, aquele que foi certamente, o mais
famoso e temível chefe político da região: o coronel Isaias Arruda de
Figueirêdo. Filho do lugar, ex-delegado de polícia, então prefeito pela força
da vizinha Missão Velha. E, de quebra, o maior dos coiteiros de Lampião no
interior cearense. Um autêntico mantenedor de jagunços e hábil negociador
político junto aos potentados da vizinhança, assim como os grandes da capital.
O tempo escorria tal qual o suor no
rosto daquela turba de anônimos já impacientes pela delonga. O relógio do
prédio apontava 14h25min quando, finalmente, todos puderam escutar o apito
estridente da velha máquina a ecoar no horizonte. Apenas Sabina, entretida demais com o seu café,
não se deu conta daquele acontecido. Todos, de repente voltaram suas atenções na direção
do corte-grande lá pras bandas do alto da cruz, do sito Frade. A paz da Aurora estava prestes a sofrer um abalo...
O trem da
Fortaleza vinha ligeiro e enfezado beirando o rio Salgado na ânsia de chegar
tão logo às terras do Crato. E chegou à Aurora. Esbaforido e com sede como se fosse um animal
cansado
Enquanto exímios chapeados
transportavam com pressa e sem nenhum cuidado, grandes caixotes, sacos, pacotes
e outros fardos de mercadorias aos sopapos. Uns desciam para o armazém da RVC
outros subiam para os vagões do trem com destino ao Crato. Animais, coisas de
madeira, artesanato, aguardente, rapadura, oiticica, panelas de barro. O trem
acelerava a curiosidade, tanto quanto a economia daquela vila quase esquecida
no oco do mundo.
Mas de repente, o som de um tiro seco
ribombeou no ar. Quebrando a normalidade natural daquele acontecimento diário.
Em seguida, vários outros disparos puderam ser ouvidos no interior do segundo
vagão da primeira classe. Talvez sete ou oito no total... Até hoje ninguém sabe
ao certo. Um silêncio quase sepulcral se abateu na plataforma por alguns
instantes que pareceram eternos. Somente o roncar da locomotiva um pouco mais a
frente estacionada defronte a caixa d’água. Em seguida uma correria...
Vozes diziam tratar-se de uma
discussão. Três homens saíram atracados e em seguida correram no sentido
contrário do vagão. Uma disparada em direção do armazém e depois para o beco da
antiga rua que dava para o cemitério. De súbito, um quarto homem um tanto
elegante, rosto jovem e bem tratado. Gestos aparentemente finos, surgiu do
segundo vagão da primeira classe. Vestia impecavelmente um terno de linho
branco. Olhar altivo. Pisou de modo esquisito e desaprumado o piso, a pedra da
estação. Alguns passos apenas e cambaleando fitou a multidão como quem quisesse
dizer algo. Não foi possível. Sangrando e com a mão direita colada ao peito
chamava baixinho pelo primo.
O linho branco do seu terno agora começava a se
tingir de vermelho. Seus sapatos de cor marrom e bem polidos contrastavam com o
vermelho escuro do seu próprio sangue formando poças na plataforma enfumaçada. Era o
coronel Isaias Arruda, chefe político, filho da terra. Prefeito da Missão
Velha. Alguém logo afirmara em meio a multidão de curiosos.
Homem afamado em
toda região, desde as bibocas à capital do estado. Um líder corajoso e ousado. Devagar caiu ao chão da plataforma
ainda com arma intacta junta ao cinto. Não teve tempo sequer de usá-la.
Alguém saindo de dentro do vagão
posterior se aproxima dele e forra o chão da pedra com um jornal que lia;
edição do dia 3. Seu braço esquerdo e parte superior do tórax estavam em
frangalhos.
Ferimentos gravíssimos provocados pelos vários balanços com que
fora atingido mortalmente. E o coronel, mesmo seriamente alvejado, bastante ferido, pronunciou
baixinho quase inaudível:
- Os irmãos paulinos me acertaram!
Eles
me acertaram!
- Mas como é que nem o Viana nem ninguém me avisou que meus
inimigos estavam aqui?!
Oh, Bando de covardes...
E de chofre emendou:
- alguém me chame o farmacêutico!
Foram os Paulinos, eles me
acertaram... repetiu: - Bando de covardes!
Outros mais ousados iam aos poucos se aproximando da vítima que gemia deitada ao
solo da pedra, sobre as folhas do jornal ‘O Ceará’. Enquanto isso, um mais pouco
afastado da estação José Vicente ou Nezinho de Milica, dois primos saíram em
perseguição(ou fugindo) dos irmãos paulinos: Antonio e Francisco, responsáveis
pelo atentado.
Foi levado para à residência de
Cícero Ferreira do lado do poente e, em seguida,
para a de Augusto Jucá um antigo amigo morador da rua grande. Isaías foi socorrido. Inicialmente por um farmacêutico prático - o único
que existia na cidade. No dia seguinte, bem cedo, dois médicos de Iguatu vindo de trole
pela linha da RVC: Antenor Cavalcante e Sérgio Banhos atenderam o coronel.
Porém, diante da gravidade dos ferimentos não tiveram como salvá-lo. Sendo que
no dia 8 de abril uma quarta-feira às 6h da manhã, quatro dias após ter sido
baleado, Isaías Arruda faleceu como que por capricho do destino na terra em que
nasceu, foi batizado, cresceu, casou e foi delegado.
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Antiga Fazenda Ipueiras do cel. Isaías em dia de Cariri Cangaço |
Rumores apontaram ter sido o
assassinato uma vingança de Lampião pela suposta traição do coronel um
ano antes, durante o célebre “fogo da Ipueiras” (fazenda de sua propriedade) ao
lado de Zé Cardoso e o major Moisés Leite de Figueiredo. Além da tentativa de
envenenamento do bando lampiônico, em cujo local Virgulino se arranchara por
diversas vezes. Ocasião em que o rei do cangaço fugia das volantes, após o
fracasso da invasão à Mossoró, arquitetada sob as estratégias de Massilon Leite
e financiada pelo próprio coronel.
Mas o certo, segundo se provaria
logo depois, foi que os paulinos vingaram o assassinato do irmão mais velho João,
morto numa emboscada no serrote d’Aurora pelos jagunços de Arruda no ano
anterior.
Terminava ali de modo trágico, na
estação ferroviária de Aurora a verdadeira saga de um dos mais temíveis e respeitados
coronéis do Cariri - Isaías Arruda de Figueirêdo. Assim como, sua rixa
ferrenha contra os irmãos paulinos da Aurora.
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Prof.
José Cícero.
Escritor,
Pesquisador e Poeta -
Secretário
de Cultura e Turismo de Aurora - Ce.
jcaurora.blogspot.com
www.blogdaaurorajc.blogspot.com
Fotos: arquivo JC
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EM MISSÃO VELHA - ISAÍAS ARRUDA
E EM AURORA DIA 20 DE SETEMBRO
19 H- MARICA MACEDO DO TIPI.
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