domingo, 13 de março de 2011

A estratégia de Lampião na geografia da caatinga da Aurora

Abaixo, notável relato do professor e pesquisador José Cícero sobre a façanha realizada por Virgulino Ferreira em terras sul cearenses, mas precisamente em sua Aurora, após cerco e fuga da Fazenda Ipueiras de Zé Cardoso e Izaias Arruda, depois da malograda invasão a Mossoró. Da: Editoria do site Cariri Cangaço"No dia 7 de julho de 1927 por volta das 13h em meio a um intenso tiroteio contra as tropas do major Moisés de Figueredo e os jagunços do Cel. Izaías Arruda os cabras de Lampião saíram às pressas da fazenda Ipueiras de Aurora. Dias antes porém, no início do mês, adentraram o município de Aurora pela serra da Varzea Grande na extrema com Lavras da Mangabeira rompendo um novo cerco, depois do cansaço da Macambira anteriormente corrido no riacho do sangue. Que deste feita fora empreendido pelos lavrenses irmãos Augustos.
Lampião pernoitou às margens de um riacho(das murtas) na altura do sítio Ribeiro(próximo onde existe hoje o cemitério de Santa Vitória). Lá alimentou todo o seu bando. A comida lhe foi oferecida pelo proprietário da terra o Sr. Rangel. Pela madrugado rompeu mais um cerco, agora empiquetado pelas volantes paraibanas e do do rio grande do Norte.
Saíra milagrosamente mais uma vez ileso. Até hoje, a passagem do brando no meio das duas volante é um mistério. De lá seguiu para o sítio Malhada Funda, quando foi recebido pelo proprietário o Sr. Gregório Gonçalves em sua residência. Um casarão semi-abandonado mas ainda hoje de pé.
Ao redor da casa grande da fazenda o bando almoçou. Um garrote e dois bodes foram assados para os cangaceiros. De lá seguiram para a serra dos Cantins guiado pelo morador do lugar de nome David Silva. Até o dia 7 Lampião e seus comandados ficaram acoitados entre a serra do Coxá, Diamante, cantins ambas na direção e proximidades da célebtre fazenda Ipueiras - propriedade de Zé Cardoso e o Coronel Izaías Arruda, grande coiteiro do cangaceiro. Neste coite, recebeu por várias vezes algumas autoridades não apenas de Aurora.
A comunicação entre o esconderijo e a fazenda(quartel-mor) do cangaço era feita pelo vaqueiro de Izaías Miguel Saraiva que dias depois seria o encarregado de preparar o banquete envenenado. Na fazenda Ipueiras ocorreria dias depois o cerco e o tiroteio, após a recusa da comida com veneno.
O ziguezague que a partir dali realizou o rei do cangaço no território aurorense foi algo só digno de um profundo conhecedor da caatinga aurorense. Logo após a hsitórica traição e o chamado fogo da Ipueiras, Lampião com o que restou do seu bando seguiu para a serra do Góes já na divisa com Caririaçu indo pelas bandas do Pau Branco atravessando o Salgado na altura do sítio Barro Vermelho, passando pelo Jatobá, Brandão e pernoitando em Vazantes.
De lá se dirigiu para a serra dos Quintos e no dia 9 para a serra dos Góes, seguindo pelo riacho da boa vista até a ponta da serra pras bandas do Cajuí.
Adentrou assim o município de Milagres transpondo a linha de ferro na localidade de Morro Dourado ainda em terras de Aurora já nas proximidades de Ingazeiras. Uma volta que envolveu todo o perímetro do território aurorense. Esta estratégia deixou completamente perdidos os que o caçavam a ferro e fogo.
Dali conseguiu penetrar sem ser incomodado o estado da Paraíba pelas fímbrias da serra de Santa Inês. Sem sombra de dúvidas, um fino estrategista. Verdadeiro preá das matas.
Dera um banho de conhecimento geográfico nas diversas frentes policiais que tentaram cercá-lo no Cariri e alhures, sobretudo nas saídas para Paraíba e Pernambuco. Este tino de rasgar os sertões com exímia perícia era uma coisa admirável no ‘Che Guevara’ dos grotões. Indubitavelmente foi notável também neste aspecto.
Esta capacidade invejável de vencer os sertões inóspitos do Nordeste ajudara bastante nas incursões que fizera com sucesso durante todos os anos que pontificou com o rei do cangaço. Lugares que até então, nenhum cristão da capital havia posto os pés e nem sequer ouvido falar. Porém, por conta de Lampião, estava lá nos jornais da época, na pauta dos governos, na boca da sociedade elitista, malgrado toda a crítica contra ou a favor do Virgulino, os sertões passaram a fazer parte da agenda da capital.
Por tudo isso, o cangaço ajudou de alguma maneira, a denunciar o sofrimento dos sertanejos abandonados pela sorte e pelo poder diante de toda uma dura excludência. Numa época em que o mapa social do Brasil quase sempre não passava do Litoral. Eis aí o maior legado deixado por Lampião."
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José Cícero
Secretário de Cultura
e Pesquisador de Aurora.
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